A RAINHA TINHA UM PÉ NA COZINHA
Esta linda e inocente garotinha de 7 anos é Elizabeth Angela Marguerite Bowes Lyon, que se tornaria rainha da Inglaterra e, depois, quando a filha subiu ao trono como Elizabeth II, passou a usar o título de rainha-mãe – embora os súditos gostassem de chamá-la de “a avó de todos os ingleses”.
Morreu em 2002, com 102 anos e ilibada reputação. Nunca se disse uma única palavra maldosa sobre ela. Agora, porém, um livro inteiro foi escrito para revelar o segredo de sua origem: a digna esposa do rei e mãe da atual rainha seria na verdade filha de uma cozinheira francesa.
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Morreu em 2002, com 102 anos e ilibada reputação. Nunca se disse uma única palavra maldosa sobre ela. Agora, porém, um livro inteiro foi escrito para revelar o segredo de sua origem: a digna esposa do rei e mãe da atual rainha seria na verdade filha de uma cozinheira francesa.
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Terá a doce velhinha passado 102 anos iludida?
_Resumidamente, a história é a seguinte: depois de dar três herdeiros ao marido e perder a primogênita (Violet), vítima de difteria em 1893, lady Cecilia Glamis pirou e os médicos proibiram uma nova gravidez, o que na época significava proibir o sexo.
Mas lord Glamis, 14o Conde de Strathmore e Kinghorne, não era homem de abstinências e imediatamente botou olho grande na bela francesa Marguerite Rodiere, que trabalhava ali mesmo, na cozinha da mansão de St Paul’s Waldenbury. Tiveram dois filhos – Elizabeth e David --, adotados pela esposa, o que não chegava a ser raro entre os casais aristocráticos da Inglaterra vitoriana.
Mas lord Glamis, 14o Conde de Strathmore e Kinghorne, não era homem de abstinências e imediatamente botou olho grande na bela francesa Marguerite Rodiere, que trabalhava ali mesmo, na cozinha da mansão de St Paul’s Waldenbury. Tiveram dois filhos – Elizabeth e David --, adotados pela esposa, o que não chegava a ser raro entre os casais aristocráticos da Inglaterra vitoriana.
Os irmãos Elizabeth e David, em 1904 e 1915.
_Tal filiação explicaria o incomum “Marguerite” no nome da moça, que em nada se parecia com a pobre Cecilia – nem com o pai, a bem da verdade. E certamente era desconhecida da família real, ou George V não permitiria que o filho Bert (segundo na linha de sucessão) se casasse com ela. Parece, porém, que Eduard, o irmão mais velho que abdicou do trono para ficar com a plebéia Wallis Simpson, descobriu a verdade no curto período em que foi rei. Ele e a mulher detestavam Elizabeth (era recíproco) e lhe deram o até agora incompreensível apelido de “Cookie”.
Com a "mãe", lady Cecilia.
Com o noivo (e futuro rei) e os pais.
_A obra que está tirando o sono da família real e “ameaça” ser lançada ainda este mês tem um longo e sugestivo título: The Queen Mother, The Untold Story of Elizabeth Bowes Lyon, Who Became Queen Elizabeth the Queen Mother.
A autora é lady Colin Campbell, mulher indiscreta e habituada com histórias escabrosas que já foi responsável por outras insônias da corte: primeira a revelar ao mundo os podres do casamento de lady Di, escreveu duas biografias da princesa e espalhou o caso de Diana com o rei Juan Carlos da Espanha durante um cruzeiro em agosto de 1986.
A autora é lady Colin Campbell, mulher indiscreta e habituada com histórias escabrosas que já foi responsável por outras insônias da corte: primeira a revelar ao mundo os podres do casamento de lady Di, escreveu duas biografias da princesa e espalhou o caso de Diana com o rei Juan Carlos da Espanha durante um cruzeiro em agosto de 1986.
A biógrafa lady Campbell, que nunca foi exatamente uma dama.
_Também conhecida como Georgie Campbell, a biógrafa várias vezes não-autorizada é ela própria um escândalo ambulante. Nascida em 1949 na família Ziadie, um dos mais influentes clãs da Jamaica, seu nome de batismo é George William, pois teria nascido com “um defeito físico” que carregou até os 18 anos, quando se operou e passou a se vestir como mulher. Tornou-se modelo em Nova York, fisgou o nobre inglês Colin Campbell (irmão caçula do 12o duque de Argyll), circulou entre a aristocracia durante 14 meses, tempo que o marido demorou para descobrir que “tinha se casado com um travesti”.
Incomparavelmente mais vexaminosa é a saia justa em que a família Windsor está agora. Afinal, se Elizabeth II não sabia da avó cozinheira, foi passada para trás. Se sabia, fez todos os súditos de bobos.
Incomparavelmente mais vexaminosa é a saia justa em que a família Windsor está agora. Afinal, se Elizabeth II não sabia da avó cozinheira, foi passada para trás. Se sabia, fez todos os súditos de bobos.
ROMMEL, O RATO DO DESERTO
Calma, é claro que eu sei que o general nazista Erwin Rommel, famoso estrategista nos campos de batalha da África do Norte, era conhecido como
A Raposa do Deserto. É o neto, Josef Pan, que o chama de rato num livro em que vai contar as safadezas que aprontou com sua avó.
Não se sabe exatamente por que o até agora pacato herr Pan, de 72 anos, esperou tanto tempo para bombardear a memória do ancestral famoso. E, pelo que já relevou sobre sua obra, o romance entre o belo e ambicioso Erwin e a jovem e iludida Walburga Stemmer não tem nada de especialmente picante.
Foi como os milhares que aconteceram às vésperas da Primeira Guerra Mundial.Quando o fruto de seus amores, Gertrud, nasceu em 8 de dezembro de 1913, Walburga esperou por um pedido de casamento. Mas entendeu a reticência do amante (o futuro parecia incerto) e acreditou nas cartas em que falava do projeto de viverem juntos num “pequeno ninho de amor”.
A Raposa do Deserto. É o neto, Josef Pan, que o chama de rato num livro em que vai contar as safadezas que aprontou com sua avó.
Não se sabe exatamente por que o até agora pacato herr Pan, de 72 anos, esperou tanto tempo para bombardear a memória do ancestral famoso. E, pelo que já relevou sobre sua obra, o romance entre o belo e ambicioso Erwin e a jovem e iludida Walburga Stemmer não tem nada de especialmente picante.
Foi como os milhares que aconteceram às vésperas da Primeira Guerra Mundial.Quando o fruto de seus amores, Gertrud, nasceu em 8 de dezembro de 1913, Walburga esperou por um pedido de casamento. Mas entendeu a reticência do amante (o futuro parecia incerto) e acreditou nas cartas em que falava do projeto de viverem juntos num “pequeno ninho de amor”.
Josef Pan, o neto ressentido.
O tal ninho jamais existiu. Rommel preferiu construir um lar respeitável com a prendada e distinta Lucie Mollin, esposa bem mais apropriada para um militar condecorado. O casamento aconteceu em 1916, mas a falta de filhos manteve acesa a esperança de Walburga de que ele voltasse. Poucos meses depois do nascimento do herdeiro Manfed Rommel, em 1928, a amante abandonada percebeu que não havia mais o que esperar e se suicidou.
Walburga deixou 150 cartas escritas pelo primeiro e único homem de sua vida (nas quais o neto se baseou para contar a triste história) e uma filha que parece não ter nutrido o mesmo ressentimento que herr Pan. Gertrude manteve longa correspondência com o pai, que nunca a escondeu da mulher. Muitas vezes Rommel usou nos campos de batalha da Segunda Guerra um cachecol tricotado pela filha amorosa.
Walburga deixou 150 cartas escritas pelo primeiro e único homem de sua vida (nas quais o neto se baseou para contar a triste história) e uma filha que parece não ter nutrido o mesmo ressentimento que herr Pan. Gertrude manteve longa correspondência com o pai, que nunca a escondeu da mulher. Muitas vezes Rommel usou nos campos de batalha da Segunda Guerra um cachecol tricotado pela filha amorosa.
A família Rommel.
MANUAL DO MARIDO ESPANCADOR
A obra tem o descarado título Um Presente para o Casal Muçulmano e na primeira das 160 páginas já diz a que veio... (Leia): "pode ser necessário ameaçar e usar a força com a esposa". O autor de nome quilométrico -- Hazrat Maulana Ashraf Ali Thanvi -- parte do princípio de que é dever do marido manter o controle e, para tanto, não hesitar em bater na mulher "com a mão ou vara, reter seu dinheiro ou puxá-la pelas orelhas". Isto, se a doidivanas ousar sair de casa sem permissão ou não se embelezar para satisfazer os desejos dele.Provavelmente para evitar futuras ações judiciais, Hazrar dá algumas maneiradas "liberais" do tipo "o marido deve tratar a mulher com bondade e amor, mesmo que ela tenda a ser estúpida e lenta às vezes", e "abster-se de espancá-la excessivamente". Impresso em Nova Deli e lançado no Canadá, por enquanto o manual muçulmano de felicidade conjugal só está à venda em uma livraria de Toronto e em alguns sites.
O DICIONÁRIO DO DIABO
Família, pátria, religião, a raça humana – o escritor e jornalista Ambrose Gwinnett Bierce não tinha nada disto em grande conta. Se escrevesse hoje em dia, provavelmente haveria um bocado de gente mal-humorada rangendo os dentes e fazendo campanha contra seus livros. Em especial, o mais famoso deles, O Dicionário do Diabo. E, como de hábito, Bierce não estaria nem aí.
Afinal, definia “virtudes” como “certas abstenções”.
Viveu como bem entendeu, produziu contos incluídos em praticamente todas as antologias americanas, fez do cinismo misturado com humor negro sua marca registrada e sumiu de cena sem deixar rastros – em 1913, aos 71 anos, viajou para o México e nunca mais se ouviu falar dele. A teoria que mais combina com seu temperamento e estilo de vida é que teria sido fuzilado pelos rebeldes de Pancho Villa.
O Dicionário do Diabo é de 1880, mas a maioria dos verbetes continua atualíssima. Quer ver?
Afinal, definia “virtudes” como “certas abstenções”.
Viveu como bem entendeu, produziu contos incluídos em praticamente todas as antologias americanas, fez do cinismo misturado com humor negro sua marca registrada e sumiu de cena sem deixar rastros – em 1913, aos 71 anos, viajou para o México e nunca mais se ouviu falar dele. A teoria que mais combina com seu temperamento e estilo de vida é que teria sido fuzilado pelos rebeldes de Pancho Villa.
O Dicionário do Diabo é de 1880, mas a maioria dos verbetes continua atualíssima. Quer ver?
ABSTÊMIO – Pessoa de caráter
fraco que cede à tentação de se negar um prazer.
AFRICANO – Negro que vota no partido da gente.
AUTOESTIMA – Avaliação equivocada.
BRUXA – (1) Mulher feia e repulsiva que tem perverso pacto com o diabo. (2) Mulher jovem e bonita que tem perverso pacto com o diabo.
COVARDE – Diz-se daquele que, numa situação de perigo, pensa com as pernas.
CÚMPLICE – Aquele que, com pleno conhecimento de causa, se associa ao crime de outro; como um advogado que defende um criminoso sabendo que é culpado.
DEVOÇÃO – Reverência a um Ser Supremo, baseada em sua presumível semelhança com o homem.
DIFAMAR – Atribuir maliciosamente a outro vícios que não tivemos a oportunidade nem a tentação de praticar.
EGOÍSTA – Pessoa de mau gosto que se interessa mais por si mesma do que por mim.
EPITÁFIO – Inscrição numa tumba que demonstra que as virtudes adquiridas com a morte são retroativas.
FANÁTICO – Diz-se daquele que, obstinada e ardorosamente, sustenta uma opinião que não é a nossa.
FRONTEIRA – Em geografia política, linha imaginária entre duas nações que separa os direitos imaginários de uma dos direitos imaginários da outra.
GENEALOGIA – Estudo da nossa filiação até chegar a um antepassado que não se interessou em investigar a dele.
HISTÓRIA – Relato quase sempre falso de fatos triviais produzidos por governantes quase sempre patifes ou militares quase sempre mentirosos.
HUMILDADE – Paciência inusitada para planejar uma vingança que valha a pena.
IGNORANTE – Pessoa desprovida de certos conhecimentos que você tem e conhecedora de coisas que você ignora.
IMPUNIDADE – Riqueza.
INDEFESO – Incapaz de atacar.
INDULTAR – Cancelar uma pena e devolver o acusado à vida do crime.
IMIGRANTE – Pessoa ignorante que acha que um país é melhor do que o outro.
JUSTIÇA – Artigo mais ou menos adulterado que o Estado vende ao cidadão em troca de sua lealdade, seus impostos e seu trabalho.
LEGAL – Compatível com a vontade do juiz competente.
MORAL – Que está de acordo com uma norma de direito local e mutável. O mesmo que cômodo.
MULATO – Filho de duas raças que se envergonha de ambas.
NEPOTISMO – Prática que consiste em nomear a própria avó para um cargo público para o bem do partido.
OTIMISTA – Partidário de doutrina de que o preto é branco.
PEREGRINO – Turista levado a sério.
PRERROGATIVA – Direito de um governante a se comportar mal.
RESPEITABILIDADE – Fruto amoroso de uma careca com uma conta bancária.
SANTO – Pecador falecido, revisado e editado.
SEGURO – Engenhoso jogo de azar que permite ao jogador a confortável convicção de que está derrotando a banca.
TARIFA – Imposto aplicado às importações destinado a proteger o produtor local da avidez de seus consumidores.
ULTIMATO – Em diplomacia, exigência final, antes de fazer concessões.
URBANIDADE – A forma mais aceitável de hipocrisia. Não é incompatível com o desprezo pelos direitos alheios.
VELHICE – Época da vida na qual somos idulgentes com os vícios de que ainda gostamos e repudiamos aqueles que não temos mais coragem de praticar.
VIDENTE – Pessoa – geralmente uma mulher – que tem a capacidade de ver o que o cliente não consegue enxergar: ou seja, que ele é um idiota.
VOTO – Instrumento e símbolo da capacidade do homem livre de bancar o idiota e arruinar o país.
AFRICANO – Negro que vota no partido da gente.
AUTOESTIMA – Avaliação equivocada.
BRUXA – (1) Mulher feia e repulsiva que tem perverso pacto com o diabo. (2) Mulher jovem e bonita que tem perverso pacto com o diabo.
COVARDE – Diz-se daquele que, numa situação de perigo, pensa com as pernas.
CÚMPLICE – Aquele que, com pleno conhecimento de causa, se associa ao crime de outro; como um advogado que defende um criminoso sabendo que é culpado.
DEVOÇÃO – Reverência a um Ser Supremo, baseada em sua presumível semelhança com o homem.
DIFAMAR – Atribuir maliciosamente a outro vícios que não tivemos a oportunidade nem a tentação de praticar.
EGOÍSTA – Pessoa de mau gosto que se interessa mais por si mesma do que por mim.
EPITÁFIO – Inscrição numa tumba que demonstra que as virtudes adquiridas com a morte são retroativas.
FANÁTICO – Diz-se daquele que, obstinada e ardorosamente, sustenta uma opinião que não é a nossa.
FRONTEIRA – Em geografia política, linha imaginária entre duas nações que separa os direitos imaginários de uma dos direitos imaginários da outra.
GENEALOGIA – Estudo da nossa filiação até chegar a um antepassado que não se interessou em investigar a dele.
HISTÓRIA – Relato quase sempre falso de fatos triviais produzidos por governantes quase sempre patifes ou militares quase sempre mentirosos.
HUMILDADE – Paciência inusitada para planejar uma vingança que valha a pena.
IGNORANTE – Pessoa desprovida de certos conhecimentos que você tem e conhecedora de coisas que você ignora.
IMPUNIDADE – Riqueza.
INDEFESO – Incapaz de atacar.
INDULTAR – Cancelar uma pena e devolver o acusado à vida do crime.
IMIGRANTE – Pessoa ignorante que acha que um país é melhor do que o outro.
JUSTIÇA – Artigo mais ou menos adulterado que o Estado vende ao cidadão em troca de sua lealdade, seus impostos e seu trabalho.
LEGAL – Compatível com a vontade do juiz competente.
MORAL – Que está de acordo com uma norma de direito local e mutável. O mesmo que cômodo.
MULATO – Filho de duas raças que se envergonha de ambas.
NEPOTISMO – Prática que consiste em nomear a própria avó para um cargo público para o bem do partido.
OTIMISTA – Partidário de doutrina de que o preto é branco.
PEREGRINO – Turista levado a sério.
PRERROGATIVA – Direito de um governante a se comportar mal.
RESPEITABILIDADE – Fruto amoroso de uma careca com uma conta bancária.
SANTO – Pecador falecido, revisado e editado.
SEGURO – Engenhoso jogo de azar que permite ao jogador a confortável convicção de que está derrotando a banca.
TARIFA – Imposto aplicado às importações destinado a proteger o produtor local da avidez de seus consumidores.
ULTIMATO – Em diplomacia, exigência final, antes de fazer concessões.
URBANIDADE – A forma mais aceitável de hipocrisia. Não é incompatível com o desprezo pelos direitos alheios.
VELHICE – Época da vida na qual somos idulgentes com os vícios de que ainda gostamos e repudiamos aqueles que não temos mais coragem de praticar.
VIDENTE – Pessoa – geralmente uma mulher – que tem a capacidade de ver o que o cliente não consegue enxergar: ou seja, que ele é um idiota.
VOTO – Instrumento e símbolo da capacidade do homem livre de bancar o idiota e arruinar o país.
LOUCAS DE AMOR
Meu bisavô não queria de jeito nenhum que as filhas aprendessem a ler e escrever. Para ele, mulher alfabetizada não fazia outra coisa na vida além de trocar bilhetes marcando encontro com namorados cafajestes e encher a cabeça com histórias de amor e outras besteiras. Pois, por incrível que pareça, ainda tem gente que acredita em coisa bem parecida. E não estou falando de nenhum machista empedernido e jurássico, mas de uma das maiores gurus da mulherada americana. Palestrante, escritora e mãe de sete filhos, Kimberly Sayer-Giles iniciou uma campanha contra os romances – tanto os apimentados quanto os água-com-açúcar – cuja leitura, segundo ela, podem levar a gente à loucura.
Parece que (pelo menos, nos Estados Unidos) não está no gibi o número de mulheres que ficam primeiro viciadas e depois ensandecidas de tanto ler sobre amores tórridos com final feliz. Esse tipo de literatura estaria também destruindo casamentos e fazendo um monte de leitoras entrar numa depressão dos infernos; quando comparam a excitante vida das heroínas da ficção com sua droga de vida real, têm vontade de atear fogo às vestes. Todas nós conhecemos algum caso em que tal reação dá até para entender. O problema, porém, é que, de acordo com especialistas ouvidos pela Kimberly, não são apenas as mal-amadas, mal-casadas e/ou cabeças-de-vento que correm risco.
Quero deixar duas coisas claras: 1. não sou lá muito fã de histórias de amor e 2. desconfio de que esse papo sobre loucura é lobby de autores de livros de autoajuda. Por via das dúvidas, vou contar qual é o motivo alegado para a possível e progressiva perda de nossas faculdades mentais. Trata-se de uma crescente reação em cadeia.
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Acontece que mulher é movida por emoções; acontece ainda que esses romances emocionantes disparam a produção de uma substância química no cérebro (uma espécie de droga) que provoca euforia. Já viu que o resultado é querer mais e mais, como acontece com qualquer produto viciante. E o “vício em romance” faz o que todo vício brabo costuma fazer: distorce a percepção da realidade. Quer dizer, até quem não tem ao lado uma porcaria de homem começa a achar que está no prejuízo.
Por falar nisso, os especialistas explicam que acontece a mesma coisa com os homens em relação à pornografia. Eles também se viciam fácil, fácil. A grande diferença está no fato de não haver emoções envolvidas, já que são basicamente visuais. Portanto, podem se tornar obsessivos e chatíssimos, podem até certo ponto babar na gravata, mas dificilmente correm o risco de entrar em parafuso.
Por falar nisso, os especialistas explicam que acontece a mesma coisa com os homens em relação à pornografia. Eles também se viciam fácil, fácil. A grande diferença está no fato de não haver emoções envolvidas, já que são basicamente visuais. Portanto, podem se tornar obsessivos e chatíssimos, podem até certo ponto babar na gravata, mas dificilmente correm o risco de entrar em parafuso.
Contada assim, a teoria do enlouquecedor amor de ficção faz algum sentido. E é o que me preocupa nesse tipo de notícia. Muita gente compra como se fosse verdade só porque tem cara de verdadeiro. Uma certa dose de ceticismo não faz mal a ninguém. Ainda mais no nosso caso. Porque se for mesmo realidade, será também uma tremenda ironia de mau gosto: como se não bastasse a gente viver num país onde se lê tão pouco, agora ainda aparecem com essa ameaçadora novidade -- gostar demais de livros de amor pode nos fazer pirar e precisar de camisa-de-força. É o fim da picada!
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AINDA BEM QUE LÉA EXISTE

Talvez por stress, talvez por gênio ruim mesmo, sou dada a
explosões de impaciência e irritação. Mas comecei a me policiar depois de ler Feliz
de Outro Jeito – Uma História de Superação, do jornalista Carmo Chagas
(Textual). Mais do que um depoimento, o livro é um tributo a Léa, personagem
principal da vida dele (são casados há 43 anos) e a mulher que descobriu que a
felicidade ainda é possível depois de sofrer duas paradas cardíacas, uma semana
em coma, a amputação dos pés, uma septicemia... Não conheço Léa. Ultimamente,
porém, tenho a sensação de que ela me impede de perder a cabeça por besteiras
que costumavam me tirar do sério, como uma simples página da internet que
demora dez horas para abrir.
"(...) no dia de experimentar as próteses foi pedido que ela levasse um par de tênis. Feitos os testes com os tênis calçados nas próteses, aquilo ficou para nós como se fosse o destino da Léa. Melhor dizendo, aquilo ficou para mim como se fosse o destino da Léa. Achei que estava ótimo, considerando-se que ela estava de novo de pé, caminhando. Se tivesse que ser sempre de tênis, tudo bem. Melhor que ficar sempre sentada, na cadeira de rodas.
Mas a Léa não é do tipo que se resigna assim, sem buscar outro caminho. Um dia, andando com ela pelo Shopping Butantã, o mais próximo de nossa casa, passamos por uma loja de calçados. Ela quis olhar as vitrines e viu uma bota bonita, sem salto:
-- Carmo, o salto dessa bota é igual ao salto dos meus tênis.
Estou com a Léa há tanto tempo que sei que não adianta argumentar noutro sentido, numa situação assim. Entramos na loja, ela experimentou as botas, andou para lá, para cá, sentiu firmeza.
-- Vou levar essa bota. Vou usar essa bota.
Levou a bota. Em casa, foi logo procurar uma saia comprida, experimentou, foi até o espelho, gostou do resultado. Depois de quase um ano obrigada a usar calças compridas, ela pôde novamente usar saia. A felicidade dela nesse dia era a de um condenado que finalmente conquista a liberdade.
Mas ela não se contentou com isso. Nesse tempo ainda íamos à clínica do Nelson, para as sessões de fisioterapia com a Isabela. Num desses dias, ela viu uma prótese feminina calçada com sapatilhas. Perguntou à Isabela se também ela, Léa, poderia usar sapatilhas. Quando a Isabela respondeu que sim, Léa contou que já havia começado a usar botas.
-- Você só precisa tomar o cuidado de escolher calçado que tenha esse saltinho de dois centímetros. As suas próteses foram preparadas para esse tipo de calçado. Pode ser tênis, bota, sapatilha.
Na volta para casa, passamos por uma loja e ela escolheu o primeiro de uma série de pares de sapatilhas. Ao ver-se livre da ditadura do tênis, Léa se lembrou, meses adiante, que no passado nunca conseguia calçar os da marca All Star.
-- Tentei várias vezes, mas as costuras machucavam meus pés.
Lembrando disso, um dia ela comprou um par de tênis All Star.
Usa-os de vez em quando, revezando com as sapatilhas, com as botas, feliz por ter reconquistado a liberdade de variar o calçado conforme a roupa, conforme a ocasião. É uma felicidade que se renova todo dia."
Mas a Léa não é do tipo que se resigna assim, sem buscar outro caminho. Um dia, andando com ela pelo Shopping Butantã, o mais próximo de nossa casa, passamos por uma loja de calçados. Ela quis olhar as vitrines e viu uma bota bonita, sem salto:
-- Carmo, o salto dessa bota é igual ao salto dos meus tênis.
Estou com a Léa há tanto tempo que sei que não adianta argumentar noutro sentido, numa situação assim. Entramos na loja, ela experimentou as botas, andou para lá, para cá, sentiu firmeza.
-- Vou levar essa bota. Vou usar essa bota.
Levou a bota. Em casa, foi logo procurar uma saia comprida, experimentou, foi até o espelho, gostou do resultado. Depois de quase um ano obrigada a usar calças compridas, ela pôde novamente usar saia. A felicidade dela nesse dia era a de um condenado que finalmente conquista a liberdade.
Mas ela não se contentou com isso. Nesse tempo ainda íamos à clínica do Nelson, para as sessões de fisioterapia com a Isabela. Num desses dias, ela viu uma prótese feminina calçada com sapatilhas. Perguntou à Isabela se também ela, Léa, poderia usar sapatilhas. Quando a Isabela respondeu que sim, Léa contou que já havia começado a usar botas.
-- Você só precisa tomar o cuidado de escolher calçado que tenha esse saltinho de dois centímetros. As suas próteses foram preparadas para esse tipo de calçado. Pode ser tênis, bota, sapatilha.
Na volta para casa, passamos por uma loja e ela escolheu o primeiro de uma série de pares de sapatilhas. Ao ver-se livre da ditadura do tênis, Léa se lembrou, meses adiante, que no passado nunca conseguia calçar os da marca All Star.
-- Tentei várias vezes, mas as costuras machucavam meus pés.
Lembrando disso, um dia ela comprou um par de tênis All Star.
Usa-os de vez em quando, revezando com as sapatilhas, com as botas, feliz por ter reconquistado a liberdade de variar o calçado conforme a roupa, conforme a ocasião. É uma felicidade que se renova todo dia."
GRANDE WERNECK!

Uma das crônicas de Esse
Inferno Vai Acabar, novo livro do jornalista Humberto Werneck, começa
assim:
“Durante uns bons trinta anos, às vezes não tão bons assim, passei grande parte do meu tempo em redações de jornais e revistas. Deixaram em mim uma saudade moderada – saudade misto de alívio, como a que sentem os veteranos do CPOR, seguros de que a coisa não vai se repetir.”
Sei direitinho do que ele está falando. Temos em comum alguns anos dessas tais lembranças, na redação do Jornal da Tarde nos anos 70. Ele é que não sabe – só vai saber agora – como seu sorriso irônico e humor ferino ajudaram a tornar docemente melancólicas as lembranças daquele tempo que, felizmente, não volta mais.
O SEGUNDO FIM DO MUNDO
O Samuel está de novo com a conversa de que o mundo vai acabar.
— De 2012 não passaremos — anuncia ele, enquanto monta meu novo armário de cozinha.
— Então ainda temos um tempinho — comento. — Só espero que este armário aguente firme até lá.
Homem de pouquíssimas palavras, o Samuel está excepcionalmente loquaz, quem sabe disposto a tirar até 2012 o atraso de toda uma vida levada aos monossílabos. Na outra vez, não abriu o bico.
Na outra vez: talvez você se lembre daquele dia, 11 de agosto de 1999, uma quarta-feira (pelo menos não estragaria o fim de semana) em que, conforme previsão de Nostradamus, reforçada pela ocorrência de um eclipse, o mundo ia acabar. Por um momento, foi um grande assunto. Confesso que não dei muita bola. A humanidade ali angustiada e eu escrevendo alguma coisa naquele 11 de agosto, mais preocupado com outro deadline e indiferente ao fato de que a qualquer momento (Nostradamus não precisou a hora) a mão de Deus, ou do Diabo, viria desligar não só o computador como o próprio usuário.
O Samuel estava entre os que levaram a coisa a sério, ele e sua mulher, a Suely, com quem tocava a Marcenaria SS, sociedade em que cabia ao marido fazer tudo, e à mulher, mandar nele e a cada passo lhe puxar as orelhas, que, sendo de abano, pareciam ter sido feitas para isso. Os dois acreditaram na previsão e, na moita, se prepararam para o Apocalipse.
Dessas fichas que só vão cair muito tempo depois, quando então tudo se esclarece. Aí por junho, julho daquele ano, o Samuel e a Suely, sempre tão disponíveis, pararam de pegar encomendas. “Para final de agosto? Olha, não vai dar.” E mais não diziam. Pessoas corretíssimas, não queriam enganar ninguém, prometendo armários, estantes e bancadas de banheiro e cozinha para casas que já teriam virado pó.
Também não viram sentido em renovar a matrícula dos filhos para um segundo semestre que iria durar apenas onze dias. Pagaram os fornecedores, liquidaram as prestações e trataram de não fazer novos compromissos. Ao se darem conta de que seu aniversário de casamento, 23 de agosto, ia cair depois do fim do mundo, anteciparam para o dia 8 a comemoração, à qual se deu também o caráter de despedida geral. Bem mais tarde o Samuel me contou que cuidaram de cada detalhe, das roupas com que deixariam a vida ao cardápio da última refeição, sem esquecer o tema musical do fim. Não, não foi a trilha sonora de Apocalypse now. Escolheram “O barquinho”, o clássico de Menescal e Bôscoli. Mas por que, Samuel? Sei lá, disse ele, enrubescido, e cantarolou com voz ruim:
“o barquinho vai, a tardinha cai...”
Tudo providenciado, sentou-se a família à espera do nada.
Nós, os clientes, só soubemos do que se passava quando, um pouco adiante do 11 de agosto, alguém deu notícias algo sombrias do casal. Mais atarantado que de hábito, o Samuel atravessou semanas sem botar os pés na marcenaria, incapaz de bater um prego. E a Suely, nem se fala: pela primeira vez despida de seu figurino de mulher mandona, deixou-se chafurdar na mais escura, espessa e gosmenta depressão, dessas que consomem uma nota preta com tarjas idem. Já que o mundo não acabara, parecia decidida a se acabar ela própria, de enraivecida inanição. Sentia-se traída por tudo e por todos. Na falta de poder descarregar sobre aqueles tratantes — Nostradamus e o eclipse —, voltou-se a Suely contra o pobre do Samuel, cujo par de orelhas foi pouco para tanto puxão. Em vez do mundo, acabou-se o casamento.
Mas já faz tempo, e ele refez sua vida. Decididamente, o barquinho vai. Mesmo tendo perdido um S, a marcenaria voltou a prosperar. O Samuel se casou de novo e, segundo dizem, melhorou de mulher. Como não se pode ter tudo, piorou de sogra. É o fim da picada, desabafa entre duas marteladas. Mas não é o fim do mundo, pondero eu. Ainda não, emenda ele. Ainda não.
O Estado de S. Paulo, 26/12/2010
“Durante uns bons trinta anos, às vezes não tão bons assim, passei grande parte do meu tempo em redações de jornais e revistas. Deixaram em mim uma saudade moderada – saudade misto de alívio, como a que sentem os veteranos do CPOR, seguros de que a coisa não vai se repetir.”
Sei direitinho do que ele está falando. Temos em comum alguns anos dessas tais lembranças, na redação do Jornal da Tarde nos anos 70. Ele é que não sabe – só vai saber agora – como seu sorriso irônico e humor ferino ajudaram a tornar docemente melancólicas as lembranças daquele tempo que, felizmente, não volta mais.
O SEGUNDO FIM DO MUNDO
O Samuel está de novo com a conversa de que o mundo vai acabar.
— De 2012 não passaremos — anuncia ele, enquanto monta meu novo armário de cozinha.
— Então ainda temos um tempinho — comento. — Só espero que este armário aguente firme até lá.
Homem de pouquíssimas palavras, o Samuel está excepcionalmente loquaz, quem sabe disposto a tirar até 2012 o atraso de toda uma vida levada aos monossílabos. Na outra vez, não abriu o bico.
Na outra vez: talvez você se lembre daquele dia, 11 de agosto de 1999, uma quarta-feira (pelo menos não estragaria o fim de semana) em que, conforme previsão de Nostradamus, reforçada pela ocorrência de um eclipse, o mundo ia acabar. Por um momento, foi um grande assunto. Confesso que não dei muita bola. A humanidade ali angustiada e eu escrevendo alguma coisa naquele 11 de agosto, mais preocupado com outro deadline e indiferente ao fato de que a qualquer momento (Nostradamus não precisou a hora) a mão de Deus, ou do Diabo, viria desligar não só o computador como o próprio usuário.
O Samuel estava entre os que levaram a coisa a sério, ele e sua mulher, a Suely, com quem tocava a Marcenaria SS, sociedade em que cabia ao marido fazer tudo, e à mulher, mandar nele e a cada passo lhe puxar as orelhas, que, sendo de abano, pareciam ter sido feitas para isso. Os dois acreditaram na previsão e, na moita, se prepararam para o Apocalipse.
Dessas fichas que só vão cair muito tempo depois, quando então tudo se esclarece. Aí por junho, julho daquele ano, o Samuel e a Suely, sempre tão disponíveis, pararam de pegar encomendas. “Para final de agosto? Olha, não vai dar.” E mais não diziam. Pessoas corretíssimas, não queriam enganar ninguém, prometendo armários, estantes e bancadas de banheiro e cozinha para casas que já teriam virado pó.
Também não viram sentido em renovar a matrícula dos filhos para um segundo semestre que iria durar apenas onze dias. Pagaram os fornecedores, liquidaram as prestações e trataram de não fazer novos compromissos. Ao se darem conta de que seu aniversário de casamento, 23 de agosto, ia cair depois do fim do mundo, anteciparam para o dia 8 a comemoração, à qual se deu também o caráter de despedida geral. Bem mais tarde o Samuel me contou que cuidaram de cada detalhe, das roupas com que deixariam a vida ao cardápio da última refeição, sem esquecer o tema musical do fim. Não, não foi a trilha sonora de Apocalypse now. Escolheram “O barquinho”, o clássico de Menescal e Bôscoli. Mas por que, Samuel? Sei lá, disse ele, enrubescido, e cantarolou com voz ruim:
“o barquinho vai, a tardinha cai...”
Tudo providenciado, sentou-se a família à espera do nada.
Nós, os clientes, só soubemos do que se passava quando, um pouco adiante do 11 de agosto, alguém deu notícias algo sombrias do casal. Mais atarantado que de hábito, o Samuel atravessou semanas sem botar os pés na marcenaria, incapaz de bater um prego. E a Suely, nem se fala: pela primeira vez despida de seu figurino de mulher mandona, deixou-se chafurdar na mais escura, espessa e gosmenta depressão, dessas que consomem uma nota preta com tarjas idem. Já que o mundo não acabara, parecia decidida a se acabar ela própria, de enraivecida inanição. Sentia-se traída por tudo e por todos. Na falta de poder descarregar sobre aqueles tratantes — Nostradamus e o eclipse —, voltou-se a Suely contra o pobre do Samuel, cujo par de orelhas foi pouco para tanto puxão. Em vez do mundo, acabou-se o casamento.
Mas já faz tempo, e ele refez sua vida. Decididamente, o barquinho vai. Mesmo tendo perdido um S, a marcenaria voltou a prosperar. O Samuel se casou de novo e, segundo dizem, melhorou de mulher. Como não se pode ter tudo, piorou de sogra. É o fim da picada, desabafa entre duas marteladas. Mas não é o fim do mundo, pondero eu. Ainda não, emenda ele. Ainda não.
O Estado de S. Paulo, 26/12/2010