PURA ILUSÃO
Outro dia, lendo uma pesquisa científica, encontrei uma palavra que não conhecia mas que define uma coisa manjadíssima: pareidolia. Sabe quando a gente olha para o céu e acha as nuvens iguaizinhas a um castelo, um urso, um amigo que não encontramos faz tempo? Sabe quando algumas pessoas juram ver imagens de santos em paredes descascadas, troncos de árvore, até em sanduíches? É isso. Trata-se, segundo os especialistas, de uma ilusão criada pelo cérebro que nos faz ver (ou mesmo ouvir) o que queremos ver, não o que realmente está lá. Claro que as imagens criadas dependem de quem somos. Dificilmente, uma pessoa sem fé enxergará, por exemplo, o manto da Virgem nas asas de uma borboleta azul.
Não se conhece nenhuma utilidade prática para semelhante fenômeno, embora os evolucionistas desconfiem de que pelo menos a habilidade para associar coisas com rostos tenha ajudado os homens primitivos a memorizar a aparência de amigos e inimigos, e não confundir os dois. Achei meio absurdo – mesmo em priscas eras – um ser pensante se atrapalhar a ponto de não reconhecer de cara alguém que já aprontou com ele. Mas depois, pensando melhor e lendo mais um pouquinho, percebi que é um bocado comum ignorar a realidade e a experiência para se deixar levar pelas aparências. Quando não se trata de uma brincadeirinha do tipo “o que aquela nuvem ali parece?”, ver uma coisa e enxergar outra pode provocar tremendos desastres.
Em época de eleição, o mulherio costuma ficar injuriado quando alguém sugere (e alguém sempre sugere) que muito sujeito safado bonitão se elege com os nossos votos porque somos umas tontas que só pensam naquilo. Claro que é gozação. Mas, como toda gozação, tem um fundo de verdade. E não vale apenas para nós. Todo mundo embarca nessa, segundo um novo estudo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts. O que os cientistas políticos de lá fizeram foi confirmar resultados de pesquisas anteriores: não importa o sexo do eleitor, ele se deixa, sim, influenciar pela aparência do candidato. Entre os eleitores menos informados, 10% dos votos vão para os boa pinta ou para os que parecem gente fina. Entre os que acompanham a campanha inteirinha pela televisão, 4,8% escolhem seu representante pelas qualidades que acham estar vendo.
Aliás, arranjar outros tipos de emprego também depende um bocado das aparências. E não me refiro ao fato de que os mais bonitos e mais bem produzidos levam vantagem. Qualquer pequena imperfeição no rosto pode colocar tudo a perder porque desvia a atenção da maioria dos entrevistadores, garante o professor de psicologia e pesquisador Mikki Hebl, da Universidade Rice (Texas). Quer dizer, aquele sinal de nascença, aquela cicatriz, aquela maldita espinha no nariz que aparece na hora errada são realmente verdadeiros “empata”. Enquanto a gente se desdobra para mostrar competência, a criatura do outro lado da mesa olha fascinada para um detalhe que não tem nada a ver com a história, mas – que irritante! – parece demais alguma coisa que ela não consegue lembrar o que é.
E quer saber de outra? Preocupar-se demais com a própria aparência tem efeitos tão passageiros quanto as nuvens que agora são iguaizinhas ao castelo da Branca de Neve e em segundos se desfazem. Diz a pesquisadora Eileen Zurbriggen, da Universidade da Califórnia, que quem faz isso corre o risco de virar uma pareidolia ambulante: encantadora, quase sempre, mas jamais confiável.